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Entender a Paisagem Protegida da Cultura da Vinha da Ilha do Pico

Entender a Paisagem Protegida da Cultura da Vinha da Ilha do Pico

18 de Abril de 2022

A Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico foi classificada como Património Mundial pela UNESCO em 2004, tendo como fundamento estes critérios, aprovados no Relatório “Decisions and Summary Record” WHC-04/28.COM/26, p. 228 (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization - Convention concerning the protection of the world cultural and natural heritage - World Heritage Committee):

“Suzhou, China

28 junho – 7 julho 2004

Critério iii

– A Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico é um testemunho único, ou pelo menos, excecional de uma tradição cultural. Com efeito, existe uma diversidade de manifestações de carácter sociocultural especificamente associadas ao período da vindima e que se refletem quer na gastronomia, quer nas músicas e danças folclóricas.

Algumas destas danças típicas espelham as práticas observadas durante a vindima. Além disso, a vitivinicultura na ilha do Pico originou um intercâmbio sociofamiliar que alterou profundamente o isolamento característico das ilhas.

 

Critério iv

– A Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico é um exemplo notável de paisagem que ilustra um período significativo da história humana.

Trata-se de uma paisagem construída a partir da chegada dos primeiros colonos, após o descobrimento do arquipélago dos Açores pelos portugueses, no século XV.

As primeiras referências documentais escritas que atestam a sua existência datam do século XVII, referindo‑se já à cultura da vinha perfeitamente consolidada, como atividade significativa na ilha. A sua implantação iniciou‑se nas zonas junto à costa, de maior concentração de lava, prolongando-se para o interior, pela encosta, intensificando‑se com o concurso das instituições que consolidaram este tipo de colonização, como é o caso das ordens religiosas.

 

A Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico está indissociavelmente ligada aos descobrimentos portugueses e a um tipo de modelo de povoamento significativo desta etapa da história humana. É consequência da fixação portuguesa em território virgem transformado em paisagem viva e produtiva até aos nossos dias. As suas estruturas, não sendo arqueológicas, são transformadas, substituídas, repostas e alteradas ao longo dos séculos dentro de uma coerência total em respeito ao modelo inicial de adaptação ao meio, concebido e posto em prática pelas primeiras comunidades que ali se fixaram.”

 

In Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico - Candidatura a Património Mundial, 2004, AAVV, pp. 30 e 31.

Desde 2005, tem uma gestão específica pelo Gabinete Técnico da Vinha da Ilha do Pico, dependente do membro do Governo com competência em matéria de ambiente, atualmente constituído pela Secretaria Regional do Ambiente e Alterações Climáticas.

A paisagem classificada e a sua zona de proteção inserem-se parcialmente na Área de Paisagem Protegida da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, que também inclui a Ponta do Mistério da Prainha e a Ponta da Ilha.

No entanto, a classificação desta área como Paisagem Protegida de Interesse Regional remonta a 1996 e o uso e transformação do seu solo está regulamentado desde 2002. Mais tarde, em 2006 entrou em vigor o Plano de Ordenamento da Paisagem Protegida da Cultura da Vinha da Ilha do Pico (POPPCVIP) aprovado pelo Decreto Regulamentar Regional n.º 24/2006/A, de 13 de julho, constituindo o primeiro, e único até à data, instrumento de gestão territorial desta natureza a ser aprovado na Região Autónoma dos Açores, tendo sido revisto em 2014.

O POPPCVIP foi elaborado com vista à salvaguarda dos valores ambientais, de paisagem, de conservação da biodiversidade e de fomento ao desenvolvimento sustentável da ilha do Pico, tendo como objetivos estratégicos a recuperação, reabilitação e conservação da paisagem da cultura tradicional da vinha do Pico em currais, a promoção do crescimento da atividade vitivinícola, o incentivo da complementaridade com o turismo e outras atividades económicas, e a promoção de uma gestão integrada da Área de Paisagem Protegida.

A Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico foi distinguida com o Prémio Nacional de Paisagem em 2018, assim como com o primeiro prémio na categoria de “Melhor Desenvolvimento de uma Paisagem Cultural de Relevância Europeia” dos European Garden Awards em 2019.

Fazem parte integrante da paisagem cultural os seguintes elementos resultantes da intervenção humana, que são referências nesta paisagem: a vasta amplitude de vistas panorâmicas de paisagem das vinhas tradicionais em produção intercaladas com vinhas abandonadas, constituídas por muros de pedra de basalto; núcleos costeiros, constituídos por conjuntos de edifícios concentrados junto a zonas estratégicas da costa – casas solarengas ou solares, ermidas, e edifícios de apoio à produção, como adegas, armazéns e alambiques; poços de maré; rola-pipas; rilheiras ou regueiras;  portos, portinhos e embarcadouros; casas de abrigo; e descansadouros.

Estão, igualmente, incluídos elementos naturais tais como campos de lava e cavidades vulcânicas, que são a base geomorfológica de toda esta paisagem, habitat naturais que integram fauna e flora específica, e o clima.

Para além dos elementos físicos – elementos naturais e intervenção humana na paisagem –, também está associado património histórico e cultural: a produção de um vinho histórico, que foi o motivo para a criação desta paisagem vitivinícola; e a cultura da população local, que engloba cultos religiosos cristãos e tradições populares.

Esta paisagem também é sua e, tal como foi reconhecida mundialmente pela UNESCO, também pertence à Humanidade, e às gerações que hão de vir. Está inscrita na lista dos bens classificados como Património da Humanidade, à semelhança das Pirâmides do Egipto, do Coliseu e Centro Histórico de Roma, do Douro Vinhateiro, da Grande Muralha da China, da Acrópole de Atenas na Grécia, da cidade inca de Matchu Pichu nas Montanhas dos Andes, das Pirâmides Maias na América Central, dos gigantes Moais da Ilha de Páscoa, da grande Mesquita de Djenné no Mali, entre tantos outros sítios reconhecidos pelo seu valor excecional universal.

Não existe outra paisagem como esta em mais nenhuma parte do nosso planeta: com toda a sua história, com todos os seus pormenores e detalhes, com todas as suas formas, cores, com todas as suas rochas, maresia, flora e fauna, com todos os seus sentimentos, sentidos e memórias. Trata-se do nosso chão, da nossa identidade, da nossa casa.

Este bem é um legado dos nossos antepassados que ao longo de seis séculos souberam usar este território para seu proveito e sobrevivência, mas não o destruíram nem descaracterizaram, e a sua intervenção no meio natural resultou num compromisso sublime e engenhoso entre o Homem, o meio natural, o clima e a beleza de uma obra de arte, que neste caso é gigante e abrange mais de 7 % da superfície da nossa ilha. E, no horizonte como cenário de fundo, a imponente presença da nossa Montanha do Pico.

Viver e gerir tudo isto implica estratégia e equilíbrio de acordo com as dinâmicas e com o passar dos tempos, para que os seus valores e atributos não se percam.

Os processos de gestão tendem a aperfeiçoar-se com a prática, com as dinâmicas dos tempos, com as políticas e com a participação de todos nós.

Que nunca sejamos assaltados pelo sentimento de perda, do qual só nos apercebemos quando, derradeiramente, perdemos aquilo que de bom e belo tínhamos e não sabíamos, ou não nos apercebíamos.

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